Durante os anos 1930, os principais artistas brasileiros voltaram seus olhos para as injustiças sociais do país. A amizade entre Graciliano Ramos e Candido Portinari, por exemplo, foi marcada pelo tema, numa parceria intelectual refletida em robusta correspondência epistolar. Na carta a seguir, o autor de “Vidas secas” (1938) propõe uma reflexão sobre o papel da dor no fazer artístico. A obra de Graciliano Ramos estará presente na próxima edição do Clube de Leitura do Instituto Moreira Salles, que começa no mês de julho próximo.

Rio, 18 de Fevereiro de 1946

Do site graciliano.com.br[1]

Caríssimo Portinari:

A sua carta chegou muito atrasada, e receio que esta resposta já não o ache fixando na tela a nossa pobre gente da roça. Não há trabalho mais digno, penso eu. Dizem que somos pessimistas e exibimos deformações; contudo as deformações e miséria existem fora da […]

Munido do seu usual sarcasmo, Oswald de Andrade escreveu em 1946 uma crônica em que relatava um episódio vivido em sua infância: o espancamento de uma mulher negra em frente à janela de casa. A experiência levou o escritor paulista a abandonar o diploma de bacharel em Direito e criticar, no artigo, a complacência dos advogados com as injustiças da sociedade brasileira. O texto não passou sem resposta. Cultor da representação de advogado defensor dos oprimidos, Sobral Pinto enviou a Oswald esta carta em favor da classe que, frente à opinião pública, ele representava melhor do que ninguém.  Sobral na verdade protegia seu próprio legado, marcado pela ideia de advocacia como missão pública de defesa da sociedade e, sobretudo, dos mais pobres.

Rio de Janeiro, 26 de abril de 1946

Sr. Oswald de Andrade,

Recebi, nesta heroica cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, onde há quase 30 anos vegeto como advogado, o seu “Telefonema”, transmitido pelas linhas do Correio da Manhã de terça-feira, 23 do corrente, através da estação da página 2 e do número […]

Moradora de Berna, na Suíça, desde abril de 1946, quando acompanhou o marido, Maury Gurgel Valente, em função diplomática, Clarice Lispector teve, dentre seus correspondentes assíduos, o amigo Lúcio Cardoso, por quem nutria profunda admiração. Como ele se demorasse na resposta às suas cartas, ela lhe enviou esta, em que não esconde seu desapontamento.  

Berna, 31 [de] outubro [de] 1946

Alô, Lúcio,

isto é apenas pra perguntar como você vai.

O quê? ah, estou bem, obrigada.

Sim, com frio também, obrigada.

O quê? ah, sim, mesmo no outono já se tem um grau abaixo de zero.

Que eu vou morrer de frio? Ah, sim, você talvez tenha razão. Que você tem me escrito muito? sim, […]

Depois de se formar em direito na Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1946, Fernando Sabino viajou para Nova York, onde ficou dois anos como funcionário do escritório comercial do Brasil e do consulado brasileiro. De Nova York, escreve esta carta à sua amiga Clarice Lispector, que morava em Berna, Suíça, acompanhando o marido em sua carreira diplomática.

Nova York, 10 de junho de 1946

Clarice,

Esta é a quarta carta que inicio para responder a sua. A primei­ra eu deixei no Brasil, só trouxe a primeira página, que vai junto. A segunda eu rasguei. A terceira eu não acabei, vai jun­to também. Hoje recebi uma carta do Paulo [Mendes Campos], dizendo que não tinha mandado até agora a resposta […]