Em 1975, a América Latina respirava ditaduras. Nessa altura, Augusto Boal já havia sido preso e torturado, e vivia em exílio na Argentina. Na Itália, Linda Bimbi organizava mais uma seção do Tribunal Russell cujo objetivo era pressionar governos militares por meio da denúncia de perseguidos políticos. Nesta carta a Linda, Boal intercede para que lhe concedam um novo passaporte, já que o seu tramitava na Polícia Federal do Brasil desde 1973, sem qualquer avanço. O Tribunal Russell aconteceria em Roma, de 10 a 17 de janeiro de 1976, com a presença de, entre outros, Julio Cortázar e Gabriel García Márquez, mas sem Boal que, embora tenha aceitado ser testemunha, preferiu não sair do país com risco de ser preso outra vez.

15 de setembro de 1975

Prezada Linda,
espero que você hoje já tenha recebido uma boa quantidade de material através da nossa amiga Marina. Por favor, leia e me informe sobre a sua possível utilidade; procure me informar também sobre outro material específico que possa ser útil. Eu continuarei tratando de conseguir tudo que for possível.

Em relação à […]

Por vezes, alguns poetas são capazes de subverter a natureza inútil da poesia. Entre maio e outubro de 1975, Ferreira Gullar escreveu um de seus livros mais famosos, Poema sujo, durante seu exílio na Argentina, provocado pela ditadura militar. Se, para Gullar, a poesia nasce do espanto, foi com a mesma sensação que o público-leitor recebeu os mais de dois mil versos contidos no poema-livro. Tamanha comoção suscitou uma série de pedidos ao governo para que o autor voltasse ao Brasil. Ainda que as gestões não tenham dado resultado, Gullar voltou por conta própria, sentindo que Poema sujo havia criado condições de regresso. Nesta carta à escritora Olga Savary, morta em maio de 2020 vítima da Covid-19, Gullar elogia poemas da autora de Espelho provisório (1970) e Sumidouro (1977) e anuncia a realização de Poema sujo.

Buenos Aires, 28 de novembro de 1975

Olga:

Fiquei muito contente com tua carta, tua opinião sobre Dentro da noite [1]e a notícia de que tua poesia segue em frente. Gostei muito da tua tradução do poema de Neruda sobre o abjeto Franco[2] e também da ideia de publicá-lo. Um poema profético… O teu poema “Noturno”, saído na […]

Sua mãe, Clarice

De: Clarice Lispector Para: Pedro Gurgel Valente

Dois anos antes de morrer, Clarice Lispector escreve uma carta afetuosa ao filho mais velho, Pedro Gurgel Valente, sobre o bem-estar que sentia ao pintar. Aqui, reúnem-se duas facetas de Clarice: a maternidade e o fascínio pelas artes plásticas. Dentre os vinte quadros pintados pela escritora, dois fazem parte do acervo do Instituto Moreira Salles e estarão, em breve, na exposição dedicada a Clarice no ano de seu centenário.

Rio, 25 de julho de 1975

Pedro, meu querido filho, como vai?

Lembre-se ainda que eu às vezes pintava quadros, e você também? Pois agora comprei tintas de acrílico, pincéis e telas – é uma libertação pintar. Liberta mais do que escrever.

 

            Sua mãe


 

Neste vídeo de 2014, Paulo Gurgel Valente, filho de Clarice, […]

Entre 1975 e 1977, Lygia Fagundes Telles iniciou um movimento para criar o Museu da Literatura Brasileira, uma espécie de irmão gêmeo paulista do Arquivo-Museu de Literatura Brasileira, aberto por Plínio Doyle em 1972 na Fundação Casa de Rui Barbosa. Segundo a autora, o Museu da Literatura Brasileira, com o apoio do Centro Federal de Cultura, seria um “centro de estudos e pesquisas grande o bastante para ser realmente representativo da nossa literatura”. Nesta carta ao amigo Erico Verissimo, Lygia convoca o escritor gaúcho a doar fotografias e manuscritos e a divulgar a iniciativa. Com ajuda de José Geraldo Nogueira Moutinho, foram reunidos em torno de 230 itens, mas o Museu não se tornou realidade e o material coletado, de pouca ou nenhuma divulgação até agora, está sob a guarda do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB).

[São Paulo], 12 de setembro de 1975

Erico, meu querido:

Ainda no belíssimo cartão que você me deu aqui estou para cobrar-lhe o material para nosso Museu da Literatura Brasileira: fotos (antigas, modernas, você com Mafalda, com os filhos, com os amigos) textos, manuscritos, caricaturas, cartas que escritores famosos lhe escreveram – enfim, todas as […]

Um dos maiores interlocutores de Augusto Boal quando o criador do Teatro do Oprimido esteve exilado, em Lisboa, durante a ditadura militar no Brasil (1964-1985), Chico Buarque certa vez lhe mandou notícias por meio da canção Meu caro amigo, gravada em fita K7 e enviada além-mar. Esta versão, como se pode ouvir na leitura em vídeo ao final da carta,[1] contém trechos excluídos na versão final. O fato só seria revelado publicamente em 2016, quando a equipe do IMS entrevistou o compositor, que se surpreendeu, ele mesmo, com os versos.

Rio [de Janeiro], 20 de julho [de 1975]

Caro Boal,

Você é um sacana. Peguei o seu Milagre no Brasil[2] no fim da tarde e é evidente que não consegui dormir. Terminei a leitura de manhã e perdi o dia. Mas ganhei muito mais. Que porrada. Não sei se este é o famigerado que eu trouxe para o Ênio [Silveira], e […]