Em 1975, a América Latina respirava ditaduras. Nessa altura, Augusto Boal já havia sido preso e torturado, e vivia em exílio na Argentina. Na Itália, Linda Bimbi organizava mais uma seção do Tribunal Russell cujo objetivo era pressionar governos militares por meio da denúncia de perseguidos políticos. Nesta carta a Linda, Boal intercede para que lhe concedam um novo passaporte, já que o seu tramitava na Polícia Federal do Brasil desde 1973, sem qualquer avanço. O Tribunal Russell aconteceria em Roma, de 10 a 17 de janeiro de 1976, com a presença de, entre outros, Julio Cortázar e Gabriel García Márquez, mas sem Boal que, embora tenha aceitado ser testemunha, preferiu não sair do país com risco de ser preso outra vez.

15 de setembro de 1975

Prezada Linda,
espero que você hoje já tenha recebido uma boa quantidade de material através da nossa amiga Marina. Por favor, leia e me informe sobre a sua possível utilidade; procure me informar também sobre outro material específico que possa ser útil. Eu continuarei tratando de conseguir tudo que for possível.

Em relação à […]

No dia seguinte à morte de Vladimir Herzog, diretor de jornalismo da TV Cultura, assassinado nos porões do DOI-CODI, os estudantes rapidamente se organizaram para enviar esta carta aos jornalistas brasileiros. O movimento era uma necessária reação às violências e arbitrariedades da ditadura militar que, em 1975, atingia um nível agudo com sequestros, prisões e desaparecimentos. A convocatória parece ter surtido efeito: o Sindicato dos Jornalistas, junto com diversos movimentos estudantis, organizaram um ato ecumênico que reuniu 8.000 pessoas na Catedral da Sé em memória de Herzog.

[26 de outubro de 1976]

Aos jornalistas

Nos últimos dias foram presos em São Paulo e no resto do país dezenas de pessoas. As prisões atingiram indiscriminadamente estudantes, profissionais liberais, professores, sindicalistas, operários e membros do partido reconhecido pelo Governo, o MDB. Entre eles, 10 jornalistas.

Essas prisões tiveram todas as mesmas características: o sequestro, a incomunicabilidade. As pessoas foram […]

Quando o mundo começava a amargar os horrores da Segunda Guerra Mundial, o húngaro Paulo Rónai se dedicava, solitário, a aprender português em sua terra natal. Mais que isso: ele traduziria 33 poemas de 23 poetas brasileiros, reunidos na publicação Brazilia Üzen: Mai Brazil költök [Mensagem do Brasil: os poetas brasileiros da atualidade]. Aquela era a primeira vez que, na Europa Central, “liam-se versos brasileiros e se podia entrever a existência do Brasil, até então só conhecido como produtor de café”, afirma ele. A inédita iniciativa intelectual, reconhecida pelo então presidente Getúlio Vargas nesta carta, foi uma espécie de passaporte para o professor e tradutor fugir dos campos de concentração em direção ao Brasil, sua pátria por adoção.

Rio de Janeiro, 20 de novembro de 1939

Ao Senhor Professor Paulo Rónai.

Tenho a satisfação de acusar o recebimento do vosso livro Brazilia Üzen [Mensagem do Brasil], contendo poesias brasileiras traduzidas para o idioma húngaro, que, com uma amável carta, […]

Por vezes, alguns poetas são capazes de subverter a natureza inútil da poesia. Entre maio e outubro de 1975, Ferreira Gullar escreveu um de seus livros mais famosos, Poema sujo, durante seu exílio na Argentina, provocado pela ditadura militar. Se, para Gullar, a poesia nasce do espanto, foi com a mesma sensação que o público-leitor recebeu os mais de dois mil versos contidos no poema-livro. Tamanha comoção suscitou uma série de pedidos ao governo para que o autor voltasse ao Brasil. Ainda que as gestões não tenham dado resultado, Gullar voltou por conta própria, sentindo que Poema sujo havia criado condições de regresso. Nesta carta à escritora Olga Savary, morta em maio de 2020 vítima da Covid-19, Gullar elogia poemas da autora de Espelho provisório (1970) e Sumidouro (1977) e anuncia a realização de Poema sujo.

Buenos Aires, 28 de novembro de 1975

Olga:

Fiquei muito contente com tua carta, tua opinião sobre Dentro da noite [1]e a notícia de que tua poesia segue em frente. Gostei muito da tua tradução do poema de Neruda sobre o abjeto Franco[2] e também da ideia de publicá-lo. Um poema profético… O teu poema “Noturno”, saído na […]

No ano em que seria instaurado o Ato Institucional nº 5 (AI-5), o Teatro de Arena estreava a Primeira Feira Paulista de Opinião, um espetáculo composto por seis peças escritas pelos mais importantes dramaturgos brasileiros à época, como Augusto Boal e Plínio Marcos. Às vésperas da estreia, a Censura ainda não havia liberado a montagem, o que motiva esta carta-manifesto de Cacilda Becker ao então diretor-geral da Polícia Federal do Brasil, general José Bretas Cupertino. O grupo teatral foi notificado por Brasília, que exigiu o corte de cerca de 80 trechos. Como um ato de “desobediência civil” à ditadura, os artistas decidem executar a Feira Paulista de Opinião na íntegra.

Ilmo. Senhor
General José Bretas Cupertino
MD Chefe do Departamento de Polícia Federal

O Teatro de Arena de São Paulo sempre se caracterizou, nestes últimos quinze anos, pelo constante trabalho de pesquisa em todos os setores da arte teatral. Foram notáveis suas contribuições no terreno da interpretação, da encenação e sobretudo da dramaturgia […]