“Quem ainda escreve carta?”, perguntava-se o jornalista Alberto Villas em um artigo publicado no site da revista Carta Capital em 2011. “Ninguém!”, respondia ele mesmo, constatando a aparente incompatibilidade do gênero com o mundo moderno: “Vivemos a era do skype, da msg pelo cel, do e-mail, do vaptvupt, bateu voltou”. Quatro anos depois, a lista cresceu. A ela poderíamos acrescentar o Facebook, Whatsapp, Twitter e uma infinidade de redes sociais em que a escrita reduziu-se a alguns poucos caracteres. Mas a verdade é que as cartas sobrevivem. Mesmo que não sejam mais o nosso principal meio de comunicação, elas permanecem vivas – como livros, discos, LPs e máquinas de escrever – em espaços de resistência que já existiam antes da publicação do texto de Villas e que continuam até hoje seduzindo os amantes da correspondência à moda antiga.
Um bom exemplo é o blog Trocando Cartas, criado em 2009, em São José dos Pinhais (PR), que propõe mediar o contato entre pessoas que desejam se corresponder por essa modalidade. Para participar da rede, é preciso ter mais de 15 anos e enviar nome, idade, endereço de e-mail, estado e país, além de três motivos para se corresponder. Os dados ficam disponíveis no blog e, quem quiser trocar cartas com alguma pessoa, pode enviar um e-mail diretamente para ela com a frase: “Desejo trocar cartas com você”. Este é o primeiro passo, virtual, para que se recupere a antiga relação remetente/destinatário. “Sentir aquela sensação gostosa de aguardar a carta chegar”; “Desprender-se um pouco das novas tecnologias”; “Ter uma comunicação mais profunda do que nas redes sociais, compreender/apreender melhor as pessoas” são algumas das razões apresentadas pelos interessados para atrair interlocutores. Desde sua criação, o Trocando Cartas já teve mais de 224 mil acessos e sua atualização é constante.
Em São Paulo, as cartas viraram projeto social. O Instituto de Projetos Sociais (InPrós) organiza desde 2004 um programa no qual voluntários escrevem para crianças em situação de abandono e que moram em abrigos ou Centros da Criança e Adolescente (CCAs), e vice-versa. A ideia do projeto Escreve Cartas é, por meio dessa troca, ajudar os jovens a voltar a confiar nos adultos, se conhecer melhor e reescrever sua história. Para participar, é preciso ter mais de 25 anos e, até 2011, o programa contabilizou mais de 25 mil correspondências trocadas entre jovens e adultos.
Há também ocasiões em que nada substitui o bom e velho papel. Mês passado, vários jornais noticiaram o caso de uma sobrevivente do atentado terrorista ao aeroporto em Bruxelas. Grávida, Sneha Mehta recebeu ajuda de um taxista que a levou para a emergência do Hospital Sint-Augustinus, na capital belga. Depois de ter certeza que seu bebê estava bem, a futura mãe decidiu escrever uma carta ao filho: “Olá, meu amor. Eu não sei se nós já falamos isso pessoalmente com você, mas quando você tinha 16 semanas de idade, a mamãe e o papai estavam em uma explosão no aeroporto de Bruxelas. E não importa onde a humanidade esteja hoje, eu só quero te dizer – a vida é uma coisa maravilhosa, e o mundo está realmente cheio de pessoas notáveis. […] Eu espero com todo o meu coração que você nasça em um mundo melhor, e se não, então que faça o melhor que puder para torná-lo. […] Nós o amamos além de todas as palavras, Mamãe e Papai”.