27 de outubro de 1969
Fico olhando pras tuas fotografias: uma de você cobrindo o rosto sobre a pedra, junto às gentes, irresistivelmente de calção azul e prêto; uma de você entre um discurso, Pedra Sonora abaixo, dizendo NÃO TIRA, NÃO BATE; e eu tirei, eu bati, e não me arrependo, mas me deito com uma contorção – LUIZ, LUIZ, LUIZ, eu repito – e o mesmo ranger de sempre, essa mesma Inglaterra rangendo a minha voz, o desejo que eu tenho de me afundar em você e te abraçar debaixo da lua, dentro da rede, e ser abraçada debaixo da rede, dentro da lua_______
(é preciso viver – existencialmente – a amargura de cada momento (é preciso? é preciso? eu não posso, não sei, não quero – não vou para casa, fico embromando de pura preguiça de me mover e me deitar, e em vez de pegar o presente, eu tenho de achar subterfúgios e passados e futuros e
projeções e talvez poesias e inverter e arranjar tudo que se possa arranjar e não conseguir fazer o dever nem não fazer, eu de tanta que é a tua ausência, de você meu, meu, meu, eu finjo viver. Mas não adianta) a vida é maior que um fingimento, maior que uma página azul rabiscada com dor – a vida se impõe, e me machuca,) e eu te preciso, LUIZ!
A desorganização da minha carta é latente em mim: é isso mesmo: eu ESTOU ABAGUNÇADA DE CORAÇÃO E TUDO
inacreditando
Nas cartas, nos bilhetes e nos cartões-postais, muitas músicas e muitos discos são citados por Ana. A Rádio Batuta preparou uma playlist estão 34 exemplos da ala musical da correspondência. Estão na ordem em que aparecem no livro e foram organizados por Rachel Valença, coordenadora de Literatura do IMS.
Ouça aqui: radiobatuta.ims.com.br/playlists/ana-cristina-cesar-e-a-trilha-do-amor-maiusculo