México, D.F., 6 de marzo de 1952
Mi querido Ruy,
Gracias por su carta del 25 de febrero. Me felicito del ascenso de la Legación a Embajada y de que sigue usted con nuevos ánimos para sus tareas literarias. Le envío un retrato de hace pocos años, pero que espero le agrade, y le envío también unos sonetos humanístico-burlescos, Homero en Cuernavaca. Pronto le mandaré su carta sobre el Hombre Cordial y su traducción de mi “Fuga de Navidad”. He conservado esas páginas como oro en paño. Contribuyen a cubrir “ese hiato que divide nuestras dos culturas”, y de que fue para mí una triste manifestación el silencio absoluto que acogió en el Brasil mi librito de poemas Romances del Río de Enero, todo él consagrado a Río y escrito con el corazón y con la cabeza. Talvez lo reedite yo en estos días, pues la primera edición de 300 ejemplares, hecho en Maastricht por Stols, se agotó pronto y realmente no llegó al público.
Espero Entre mar e rio[1] com vivísimo interés. Y le mando un fraternal abrazo.
Alfonso Reyes
Marselha, 7 de março de 1931
El hombre cordial, producto americano
“O verdadeiro americanismo repele a ideia de um indianismo, de um purismo étnico local, de um primitivismo, mas chama a contribuição das raças primitivas ao homem ibérico; de modo que o homem ibérico puro seria um erro (classicismo) tão grande como o primitivismo puro (incultura, desconhecimento da marcha do espírito humano em outras idades e outros continentes). É da fusão do homem ibérico com a terra nova e as raças primitivas que deve sair o ‘sentido americano’ (latino), a raça nova produto de uma cultura e de uma intuição virgem – o Homem Cordial. Nossa América, a meu ver, está dando ao mundo isto: o Homem Cordial. O egoísmo europeu, batido de perseguições religiosas e de catástrofes econômicas, tocado pela intolerância e pela fome, atravessou os mares e fundou ali, no leito das mulheres primitivas, e em toda a vastidão generosa daquela terra, a Família dos Homens Cordiais, esses que se distinguem do resto da humanidade por duas características essencialmente americanas: o espírito hospitaleiro e a tendência à credulidade. Numa palavra, o Homem Cordial. (Atitude oposta do europeu: a suspicácia e o egoísmo do lar fechado a quem passa). (Como é bom, nos pueblos e aldeiolas da nossa América, no seu México como no meu Brasil, mandar entrar o caixeiro-viajante francês que vende peças de linho, ou o engenheiro alemão que está estudando a geologia local, e convidá-lo para almoçar! A gente grita logo lá para dentro: – Ó fulana, manda matar uma galinha!)…
O fato, porém, é que se não somos latinos, nós, oriundos da aventura peninsular celtibérica em terras americanas (alimentada pelas redes nupciais de índias bravias e pela sensualidade dócil de negras fáceis), se não somos latinos, somos qualquer coisa de muito diferente pelo espírito e pelo senso da vida cotidiana. Somos povos que gostam de conversar, de fumar parados, de ouvir viola, de cantar modinhas, de amar com pudor, de convidar o estrangeiro a entrar para tomar café, de exclamar para o luar em noites claras, à janela: – Mas que luar magnífico! Essa atitude de disponibilidade sentimental é toda nossa, é ibero-americana… Observável nos nadas, nas pequeninas insignificâncias da vida de todos os dias, ela toma vulto aos olhos do crítico, pois são índices dessa Civilização Cordial que eu considero a contribuição da América Latina ao mundo.”
Ribeiro Couto
Arquivo Ribeiro Couto / Arquivo-Museu de Literatura Brasileira da Fundação Casa de Rui Barbosa; Capilla Alfonsina-INBA y Alicia Reyes Mota heredera de Alfonso Reyes.
[1] N.S.: Coletânea de poemas de Ribeiro Couto publicada em Lisboa, em 1952.