Rio de Janeiro, 15 de dezembro de 1827
Filha,
Muitas cartas tenho eu recebido tuas que me têm escandalizado pela tua pouca reflexão a escrevê-las, mas nenhuma tanto como a de hoje, em que me dizes que nossos amores são reputados por ti como “amores passageiros”. Se teus amores para comigo são assim, é porque tua amizade para comigo te não borbulha no peito como a minha para contigo. Pois sejam embora teus amores para comigo passageiros, os meus, que são baseados sobre a mais firme amizade (ainda além de todos os reveses), hão de ser sempre puros e mui constantes. Tu entendes amor pela manivérsia,[1] então ainda pior, porque reputando tu, como reputas o amor que fazes, por um “amor passageiro”, está claro que só a tua carne é quem te chama a fazer a coisa, e não o prazer de ser com teu filho, o que é capaz a dispor-te a fazeres com outro qualquer “amor passageiro” para aliviar, pois não entra em tal negócio a amizade, e portanto uma melhor figura qualquer perequê[2] te incitará a fazeres um desses “amores passageiros”. Deus me livre pensar que tu escreves isto depois de considerares. Eu estou certo que ou tua paixão ou um não sei que te compeliu a escreveres assim a
Teu filho, amigo e amante não passageiro
Imperador
Cartas de Pedro I à marquesa de Santos. Notas de Alberto Rangel. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984, p. 367.