28 de outubro de 1924

Prezado Mário de Andrade.

Procure-me nas suas memórias de Belo Horizonte: um rapaz magro, que esteve consigo no Grande Hotel, e que muito o estima. Ora, eu desejo prolongar aquela fugitiva hora de convívio com seu claro espírito. Para isso utilizo-me de um recurso indecente: mando-lhe um artigo meu que você lerá em dez minutos. Dois méritos: é curto e “fala mal” do senhor Anatole France (Aliás, Anatole France é um velho vício dos brasileiros, e meu também).

Li uma excelente carta que você enviou ao meu amigo Martins de Almeida. Quanta verdade nas suas ideias. E quanta força desabusada! Estou convencido que a questão da literatura no Brasil é uma questão de coragem intelectual. Ou por outra: é preciso convencer-se a gente de que é brasileiro! E ser brasileiro é uma coisa única no mundo; é de uma originalidade delirante. Não confundir com nacionalismo. Aliás, você sabe disso melhor do que eu.

Tenho imenso desejo de conhecer o seu “Noturno de Belo Horizonte”. Numa carta, que tive o prazer de receber de Manuel Bandeira, há entusiásticas referências a esse trabalho. Ser-lhe-á difícil ou importuno comunicar-mo?

Recomende-me ao Oswald, de quem não tenho notícias, embora lhe escrevesse.

Meu apertado abraço do seu

Carlos Drummond

Rua Silva Jardim, 108

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Carlos e Mário: Correspondência de Carlos Drummond de Andrade e Mário de Andrade. Rio de Janeiro: Bem-te-vi. 2003.